domingo, 28 de março de 2010

De mudanca

Este apartamento do 20º piso alugamos por temporada. Era só para ficar até a mudança chegar, mas já estamos aqui há 6 meses. É um confortável apartamento, estamos bem, mas é uma experiência estranha pensar nas coisas que temos e não podemos ter. Temos uma coleção de CDs da Historia do Mundo que lembramos que pode ser muito útil para o trabalho da Carol, mas está na mudança. Olho com olhar comprido o povo que fim de semana pedala ate aquele restaurante charmosinho perto-longe, mas minha bicicleta está na mudança. Na cozinha, perco um tempo procurando utensílios que, depois me lembro, não são aqui dessa casa, estão na mudança. Minha mesa de trabalho está impessoal, porque as fotos e as coisinhas que gosto de ter em volta de mim... estão na mudança.

Mas ao mesmo tempo, penso em como posso tranquilamente viver sem essas coisas. E sem muitas outras mais que sequer lembro que tenho. Viver bem assim tem muito da minha capacidade de adaptação, e também de este ser um bom apartamento, com uma decoração clássica, porém funcional. Mas para uma pessoa que gosta de acumular cacarecos (no Chile tem uma palavra pra isso: cachivachero) é toda uma evolução se desprender dos vários objetos significativos. Tenho saudade deles. Com sua historia, cada um deles é como se fosse um amigo, para o qual não posso mandar email e saber notícias. E o pior, alguns deles foram sumariamente destruídos! A alfândega do Chile é absolutamente rígida para não correr o risco de entrar praga no país, e incinerou, sem perguntar, vários “bultos” que eu até agora não sei o que eram... No relatório entregado, falavam de “adornos de madeira”: podem ser os entalhes da Chiquitania; a raiz retorcida e repolhuda de uma arvora típica boliviana; pode ser o entalhe que compramos no Sul de Portugal, lembrança da maravilhosa viagem com a Fabi e a Nanda; podem ser tantas coisas... Incineraram meu arranjo de flores secas, que eu fiz com tanto carinho... se estavam secas, que bichinho poderiam ter? Se fosse alguma das comidas, grãos andinos, wacataya, ou geleias que coloquei sorrateiramente no meio das coisas, ainda vá... Isso sem pensar o que pode ter quebrado com o famigerado terremoto.

OK, valeu para exercitar o desprendimento material, sei que posso viver sem minhas coisinhas. Mas quando tiver elas de volta, vou ficar mais feliz.

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